quinta-feira, 10 de outubro de 2013

O golpe no Paraguai e o Mercosul

O golpe no Paraguai e o Mercosul

Os defensores do golpe parlamentar que derrubou o presidente Fernando Lugo no Paraguai, a 22 de junho passado (por exemplo, o senador tucano Álvaro Dias), golpe que culminou na sua substituição pelo vice-presidente em exercício (Federico Franco), insistem no caráter “constitucional” (ou seja, legal) do impeachment que derrubou Lugo, referendado pela Suprema Corte do país. Ora, além de seu caráter sumário (36 horas!), as provas (“causas”) para o procedimento foram definidas pelo Parlamento paraguaio como “de notoriedade pública, motivo pelo qual não precisam ser provadas, conforme o ordenamento público vigente” (sic, grifo nosso). Ou seja, que o suposto “direito legal de defesa” concedido a Lugo foi puramente fictício, posto que ninguém pode se defender do que não precisa ser provado. Os parlamentares-golpistas aprovaram um arremedo de acusação no prazo de... duas horas. O Senado deu menos um dia ao presidente da República para preparar e exercer seu direito à defesa.
Promessas Descumpridas
As promessas de Lugo de melhorar a situação dos camponeses ficaram totalmente descumpridas e quando os camponeses famintos de terra saíram para ocupá-las lhes contestaram com a repressão e com concessões aos setores de direita. Em novembro de 2008, a repressão de uma marcha de sem terra deixou 55 feridos. Uma nova marcha da FNC (Federación Nacional Campesina) ocupou Assunção em novembro de 2009. A 15 de junho passado, no Norte do país, a ocupação de um terreno ilegalmente detido por um latifundiário (Blas Riquelme, terratenente do Partido Colorado) produziu um conflito que deixou onze camponeses mortos e mais de 50 feridos. Setores do movimento sem-terra, embora minoritários, foram se radicalizando e superando as direções comprometidas como o governo. Foi o caso de Curuguaty, onde ocorreu o confronto e o massacre de 15 de junho, no qual também sete policiais morreram. A palavra de ordem desse setor camponês era “morrer matando”. Sobre a violência da repressão basta ler o comunicado das “organizações sociais e camponesas, diante dos fatos públicos de 15 de junho durante o despejo das terras, a 35 quilômetros da cidade de Curuguaty, faze(ndo) um chamado às autoridades para garantir a vida dos camponeses feridos que ainda continuam nos montes, os desaparecidos, e evitar mais fatos de violência no lugar”.
Resistência só no Exterior
Enquanto o golpe se produzia, a única resistência veio... do exterior, quando o chanceler venezuelano-bolivariano Nicolás Maduro, em visita ao país em nome da Unasul, reuniu-se com os chefes das Forças Armadas paraguaias, que o receberam, afim de pressioná-los para que evitassem o golpe parlamentar em andamento (ameaçou com cortes de fornecimento de petróleo, de créditos, etc.). Embora a resposta fosse negativa (ou melhor, silenciosa) foi significativo que sua arenga (de cinco minutos!) fosse tolerada. Durante breves horas, o destino político do Paraguai pendeu entre um golpe parlamentar e um golpe militar antiparlamentar, ou seja, entre duas alternativas golpistas, todo um resumo da pseudodemocracia latino-americana. “Numa demonstração de união e celeridade na defesa da democracia, enquanto o golpe ainda se desenrolava no Paraguai, a Unasul enviou missão diplomática ao país para tentar evitar sua conclusão”, escreveu um apologista dos regimes “progressistas”. Golpe “surpresa”?: Wikileaks já havia revelado publicamente que um “golpe parlamentar” contra Lugo vinha sendo discutido por Federico Franco com representantes dos EUA... desde 2009. Em novembro de 2009, Lugo teve de demitir os principais comandantes militares. Os que os sucederam acabam de apoiar o golpe contra ele.
Política Agrária
A política agrária dos golpistas é uma guerra sem fim contra os camponeses, em defesa do agronegócio com Monsanto e os monopólios da produção de sementes e transgênicos. Subsídios aos grandes produtores de soja, manutenção de terras nas mãos de grileiros, acordo com a multinacional do alumínio (com US$ 14 bilhões em subsídios de energia elétrica que vão sair do consumidor paraguaio) e anúncios de privatizações (do sistema elétrico, telefonia, água corrente, cimentos) foram as primeiras medidas do novo governo. Rio Tinto, que contrataria... 1250 trabalhadores paraguaios, pretende um contrato de consumo de energia entre 2016 e 2045, renovável. “É uma quadrilha que está prestes a assaltar o povo paraguaio”, resumiu o dirigente da oposição, Ricardo Canese.
Paliativos Assistencialistas
Os altos preços das commodities foram usados para paliar a miséria social com planos assistencialistas e para uma acumulação parasita de reservas internacionais, um aspecto da especulação internacional, pois foi evitada a nacionalização do comércio externo e do sistema financeiro. Em vez de acumular recursos produtivos, América Latina experimentou a maior saída de capitais de sua história. Em Venezuela o petróleo se encontra formalmente nacionalizado, mas a PDVSA registra uma crise de custos e de endividamento, que a torna dependente de acordos de participação com os monopólios internacionais para explorar a Bacia do Orinoco (a Venezuela tem as maiores reservas do mundo, segundo a OPEP). Venezuela sofreu, sob Chávez, um retrocesso industrial importante (dissimulado pela renda diferencial petroleira do país) e atualmente importa 70% de suas necessidades alimentares (!)

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